História sem Fim: a escrita encontra o financiamento coletivo

Faltam menos de 2 dias para o fim da campanha +LIVROS , no Catarse. O +LIVROS é um fundo de incentivo para apoiar editoras, livrarias, autores e autoras independentes que foram afetados pela pandemia. Queria convidar você, que lê esse conteúdo, a apoiar o projeto e nos ajudar a ampliar o impacto do fundo. E para usar a lógica do financiamento coletivo, queria retribuir sua atenção. Fui pelo caminho simples, de ler livremente e buscar 3 curiosidades para compartilhar com você. Busquei informações a partir da Wikipedia, que tivessem respaldo de fontes confiáveis, que fossem legais e relacionadas a livros, escrita, financiamento coletivo ou mercado editorial. Espero que você goste da leitura!

Se você curtir este texto, considere divulgar ou apoiar financeiramente o projeto +LIVROS.

A motivação humana para transferir conhecimento é infinita. Um recurso inesgotável. Essa motivação começa com a nossa capacidade inerente da fala e com expressões corporais. Mas não era suficiente. Logo, paredes de cavernas se transformaram em murais que revelam parte do que foi a humanidade em seus primórdios. Sistemas rudimentares de representação numérica e desenhos passaram a fazer parte de nosso repertório. Ainda assim, faltava algo.

Escrita pictográfica feita por Sumérios, de 3500 a.C. Talvez o mais antigo registro de escrita no mundo (Imagem: reprodução)

Escrita pictográfica feita por Sumérios, de 3500 a.C. Talvez o mais antigo registro de escrita no mundo (Imagem: reprodução)

A escrita é uma das maiores invenções culturais da raça humana. Um conceito simples que permite criar um sistema que traduz a linguagem falada em algo que possa ser colocado de forma visual. Uma maneira de transmitir significado equivalente ao da fala através de uso de símbolos que mimetizam ou representam sons. Ela, juntamente com sistemas matemáticos, são as estruturas de base que potencializam nossa capacidade de elaborar, expressar e disseminar nossas ideias, pensamentos e interpretações sobre o mundo. Em conjunto com nossa criatividade, esses sistemas nos permitiram chegar onde chegamos.

A primeira curiosidade com a qual me deparei é que a origem da escrita é um tópico em discussão. Por muito tempo o consenso era de que o fenômeno apareceu primeiramente na Suméria, civilização localizada na região sul da Mesopotâmia, onde hoje se encontra o Iraque. A teoria era de que a escrita teria sido difundida culturalmente a partir de lá por mercadores e comerciantes. No entanto, descobertas recentes indicam que o surgimento de linguagens escritas ocorreu em partes não conectadas do mundo e em momentos diferentes. Estudiosos hoje reconhecem que a escrita foi desenvolvida de maneira independente em pelo menos 4 civilizações: Mesopotâmia (entre 3400 e 3100 a.C.), Egito (cerca de 3250 a.C.) , China (1200 a.C.), e nas áreas mais ao sul do México e na Guatemala (cerca de 500 a.C).

Abaixo você confere a foto de parte do artefato.

Imagem 3

Tábuas de argila são incríveis, mas não são muito funcionais. Avançando no tempo, a necessidade de documentar nossa arte, mitologias e história nos deu pergaminhos, papiros e vários tipos de registros manuscritos feitos de maneira artesanal. Sedenta por organizar o conhecimento, a humanidade criaria um dos objetos mais incríveis que já inventamos: o livro. Objeto milenar, resiliente, símbolo da transmissão de conhecimento. Certamente é mais fácil organizar livros do que tábuas de argila.

Imagem 4B

Até cerca de 1450 d.C, produzir um livro era algo complexo e trabalhoso. A maioria da produção era mantida por instituições religiosas ou governos e consumida apenas por aqueles que tinham acesso de berço ao aprendizado da leitura. Johannes Gutenberg muda esse cenário ao criar a primeira máquina de impressão no século 15. Para tirar o livro da era manuscrita e artesanal, Gutenberg causou uma disrupção, como chamamos hoje, e ajudou a descentralizar a produção de conhecimento. O invento de Gutenberg e suas evoluções subsequentes tornaram a produção de livros mais barata e acessível.

Alguns séculos depois, uma indústria havia nascido.

Imagem 5

No século 18, o mundo já vivenciava uma profusão de livros. Uma cadeia de produção estava formada e bem mais distribuída do que nos séculos anteriores. E aqui, nos deparamos com a terceira curiosidade: Há 300 anos, uma prática bem similar ao que hoje chamamos de financiamento coletivo ajudava autores e autoras a publicarem seus livros. Era comum que obras fossem publicadas com a ajuda de subscribers, ou assinantes, que financiavam a produção de tiragens iniciais de livros. Em um artigo de autoria de Norma Clarke, professora de Literatura Inglesa e Escrita Criativa da Kingston University, ela descreve que a prática se popularizou inicialmente pois profissionais que viviam da publicação de livros perceberam que poderiam expandir seu público, mas precisavam de capital adiantado. Para isso eles se engajavam em uma campanha para levantar fundos com esses subscribers.

Para conquistar esses apoiadores e apoiadoras, um esforço social era preciso. E quanto mais prestigiosos os subscribers, maiores os benefícios posteriores para os envolvidos com a obra. Publicadoras e impressores ajudavam a gerenciar os fundos arrecadados e era o autor ou autora que fazia a campanha, ia em busca de apoiadores. Esse tipo de financiamento, antes exclusivo das realezas e de mecenas ricos também tornou-se uma oportunidade para ampliar a base de leitores e fãs de autores e autoras. O aumento de pessoas alfabetizadas e a descentralização da produção de livros possibilitaram esse crescimento.

Em um dos casos citados no artigo de Norma, ela conta que a pesquisadora Elizabeth Elstob arrecadou fundos para uma edição e tradução da obra An English-Saxon Homily on the Birthday of St Gregory em 1709. Dentre os apoiadores e apoiadoras de Elstob, um número alto de mulheres pra época: Do total de 271 pessoas, 116 eram do sexo feminino. Clarke diz ainda que a maioria das pessoas que financiaram o projeto de Elizabeth eram conexões locais, donos de antiquários e outros pesquisadores que admiravam Elizabeth Elstob e sua dedicação. Lembrando que, no período, mulheres não faziam networking ou tinham acesso fácil à universidade, o que torna a história de Elizabeth ainda mais incrível e potente. Mas nem tudo eram flores: a campanha do poeta Alexander Pope para produzir a sua tradução da Ilíada, publicada em 1720, demorou 7 longos anos para se concretizar. Norma cita que Pope viveu uma vida confortável devido aos seus esforços e prestígio adquirido no processo.

Lista de apoiadores da tradução da Ilíada, por Alexander Pope, 6 vols. (1715-20)

Lista de apoiadores da tradução da Ilíada, por Alexander Pope, 6 vols. (1715-20) (Imagem: reprodução)

Hoje, no nosso tempo, campanhas de financiamento coletivo duram 30 dias e você não precisa bater de porta em porta para buscar apoiadores e apoiadoras para seu projeto (às vezes precisa). As pessoas te apoiam em uma página da internet. Algumas práticas nunca mudam: ter seu nome listado ao final do livro é uma das recompensas mais comuns oferecidas em projetos de publicação que utilizam o financiamento coletivo. Para ter essa sensação secular de apoiar um autor ou autora diretamente e ajudar a produzir uma obra, basta acessar o Catarse e descobrir algo que você gosta. É uma maneira de escolhermos que tipo de leitura e de conhecimento queremos produzir. É uma escolha que pode ser ativa.

E onde existem autores e autoras, provavelmente existirá um sistema de publicação e distribuição ao redor. É com a vontade de que cada vez mais conhecimento e arte sejam produzidos e difundidos, que ajudamos a articular o +LIVROS.

Te convido aqui a somar conosco, da maneira como você puder.

Fontes consultadas:

Wikipedia

  • Limestone tablet engraved with pictographic writing. It comes from the mesopotamic city of Kish (Iraq), dated from 3 500 BC. It is drawn in real size, approximately. Probably, it is the earliest known evidence of writing, and contains pictographs of heads, feet, hands, numbers and threshing-boards. Department of Antiquities, Ashmolean Museum, Oxford (United Kingdom).

Outros

Rodrigo Machado
Cofundador e CEO do Catarse. Gosta de falar através de imagens e ouvir bons livros. Não sobrevive sem doses periódicas de água do mar.

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Faltam menos de 2 dias para o fim da campanha +LIVROS , no Catarse. O +LIVROS é um fundo de incentivo para apoiar editoras, livrarias, autores e autoras independentes que foram afetados pela pandemia. Queria convidar você, que lê esse conteúdo, a apoiar o projeto e nos ajudar a ampliar o impacto do fundo. E para usar a lógica do financiamento coletivo, queria retribuir sua atenção. Fui pelo caminho simples, de ler livremente e buscar 3 curiosidades para compartilhar com você. Busquei informações a partir da Wikipedia, que tivessem respaldo de fontes confiáveis, que fossem legais e relacionadas a livros, escrita, financiamento coletivo ou mercado editorial. Espero que você goste da leitura!

Se você curtir este texto, considere divulgar ou apoiar financeiramente o projeto +LIVROS.

A motivação humana para transferir conhecimento é infinita. Um recurso inesgotável. Essa motivação começa com a nossa capacidade inerente da fala e com expressões corporais. Mas não era suficiente. Logo, paredes de cavernas se transformaram em murais que revelam parte do que foi a humanidade em seus primórdios. Sistemas rudimentares de representação numérica e desenhos passaram a fazer parte de nosso repertório. Ainda assim, faltava algo.

Escrita pictográfica feita por Sumérios, de 3500 a.C. Talvez o mais antigo registro de escrita no mundo (Imagem: reprodução)

Escrita pictográfica feita por Sumérios, de 3500 a.C. Talvez o mais antigo registro de escrita no mundo (Imagem: reprodução)

A escrita é uma das maiores invenções culturais da raça humana. Um conceito simples que permite criar um sistema que traduz a linguagem falada em algo que possa ser colocado de forma visual. Uma maneira de transmitir significado equivalente ao da fala através de uso de símbolos que mimetizam ou representam sons. Ela, juntamente com sistemas matemáticos, são as estruturas de base que potencializam nossa capacidade de elaborar, expressar e disseminar nossas ideias, pensamentos e interpretações sobre o mundo. Em conjunto com nossa criatividade, esses sistemas nos permitiram chegar onde chegamos.

A primeira curiosidade com a qual me deparei é que a origem da escrita é um tópico em discussão. Por muito tempo o consenso era de que o fenômeno apareceu primeiramente na Suméria, civilização localizada na região sul da Mesopotâmia, onde hoje se encontra o Iraque. A teoria era de que a escrita teria sido difundida culturalmente a partir de lá por mercadores e comerciantes. No entanto, descobertas recentes indicam que o surgimento de linguagens escritas ocorreu em partes não conectadas do mundo e em momentos diferentes. Estudiosos hoje reconhecem que a escrita foi desenvolvida de maneira independente em pelo menos 4 civilizações: Mesopotâmia (entre 3400 e 3100 a.C.), Egito (cerca de 3250 a.C.) , China (1200 a.C.), e nas áreas mais ao sul do México e na Guatemala (cerca de 500 a.C).

Abaixo você confere a foto de parte do artefato.

Imagem 3

Tábuas de argila são incríveis, mas não são muito funcionais. Avançando no tempo, a necessidade de documentar nossa arte, mitologias e história nos deu pergaminhos, papiros e vários tipos de registros manuscritos feitos de maneira artesanal. Sedenta por organizar o conhecimento, a humanidade criaria um dos objetos mais incríveis que já inventamos: o livro. Objeto milenar, resiliente, símbolo da transmissão de conhecimento. Certamente é mais fácil organizar livros do que tábuas de argila.

Imagem 4B

Até cerca de 1450 d.C, produzir um livro era algo complexo e trabalhoso. A maioria da produção era mantida por instituições religiosas ou governos e consumida apenas por aqueles que tinham acesso de berço ao aprendizado da leitura. Johannes Gutenberg muda esse cenário ao criar a primeira máquina de impressão no século 15. Para tirar o livro da era manuscrita e artesanal, Gutenberg causou uma disrupção, como chamamos hoje, e ajudou a descentralizar a produção de conhecimento. O invento de Gutenberg e suas evoluções subsequentes tornaram a produção de livros mais barata e acessível.

Alguns séculos depois, uma indústria havia nascido.

Imagem 5

No século 18, o mundo já vivenciava uma profusão de livros. Uma cadeia de produção estava formada e bem mais distribuída do que nos séculos anteriores. E aqui, nos deparamos com a terceira curiosidade: Há 300 anos, uma prática bem similar ao que hoje chamamos de financiamento coletivo ajudava autores e autoras a publicarem seus livros. Era comum que obras fossem publicadas com a ajuda de subscribers, ou assinantes, que financiavam a produção de tiragens iniciais de livros. Em um artigo de autoria de Norma Clarke, professora de Literatura Inglesa e Escrita Criativa da Kingston University, ela descreve que a prática se popularizou inicialmente pois profissionais que viviam da publicação de livros perceberam que poderiam expandir seu público, mas precisavam de capital adiantado. Para isso eles se engajavam em uma campanha para levantar fundos com esses subscribers.

Para conquistar esses apoiadores e apoiadoras, um esforço social era preciso. E quanto mais prestigiosos os subscribers, maiores os benefícios posteriores para os envolvidos com a obra. Publicadoras e impressores ajudavam a gerenciar os fundos arrecadados e era o autor ou autora que fazia a campanha, ia em busca de apoiadores. Esse tipo de financiamento, antes exclusivo das realezas e de mecenas ricos também tornou-se uma oportunidade para ampliar a base de leitores e fãs de autores e autoras. O aumento de pessoas alfabetizadas e a descentralização da produção de livros possibilitaram esse crescimento.

Em um dos casos citados no artigo de Norma, ela conta que a pesquisadora Elizabeth Elstob arrecadou fundos para uma edição e tradução da obra An English-Saxon Homily on the Birthday of St Gregory em 1709. Dentre os apoiadores e apoiadoras de Elstob, um número alto de mulheres pra época: Do total de 271 pessoas, 116 eram do sexo feminino. Clarke diz ainda que a maioria das pessoas que financiaram o projeto de Elizabeth eram conexões locais, donos de antiquários e outros pesquisadores que admiravam Elizabeth Elstob e sua dedicação. Lembrando que, no período, mulheres não faziam networking ou tinham acesso fácil à universidade, o que torna a história de Elizabeth ainda mais incrível e potente. Mas nem tudo eram flores: a campanha do poeta Alexander Pope para produzir a sua tradução da Ilíada, publicada em 1720, demorou 7 longos anos para se concretizar. Norma cita que Pope viveu uma vida confortável devido aos seus esforços e prestígio adquirido no processo.

Lista de apoiadores da tradução da Ilíada, por Alexander Pope, 6 vols. (1715-20)

Lista de apoiadores da tradução da Ilíada, por Alexander Pope, 6 vols. (1715-20) (Imagem: reprodução)

Hoje, no nosso tempo, campanhas de financiamento coletivo duram 30 dias e você não precisa bater de porta em porta para buscar apoiadores e apoiadoras para seu projeto (às vezes precisa). As pessoas te apoiam em uma página da internet. Algumas práticas nunca mudam: ter seu nome listado ao final do livro é uma das recompensas mais comuns oferecidas em projetos de publicação que utilizam o financiamento coletivo. Para ter essa sensação secular de apoiar um autor ou autora diretamente e ajudar a produzir uma obra, basta acessar o Catarse e descobrir algo que você gosta. É uma maneira de escolhermos que tipo de leitura e de conhecimento queremos produzir. É uma escolha que pode ser ativa.

E onde existem autores e autoras, provavelmente existirá um sistema de publicação e distribuição ao redor. É com a vontade de que cada vez mais conhecimento e arte sejam produzidos e difundidos, que ajudamos a articular o +LIVROS.

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Fontes consultadas:

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  • Limestone tablet engraved with pictographic writing. It comes from the mesopotamic city of Kish (Iraq), dated from 3 500 BC. It is drawn in real size, approximately. Probably, it is the earliest known evidence of writing, and contains pictographs of heads, feet, hands, numbers and threshing-boards. Department of Antiquities, Ashmolean Museum, Oxford (United Kingdom).

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