Humberto Figueira: 100 projetos apoiados e inspiração infinita

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É uma oportunidade fascinante ser convidado a compartilhar o sonho de uma pessoa e ainda receber uma recompensa pela experiência

Todos os dias, o  analista executivo da Diretoria da Qualidade do Inmetro Humberto Figueira, 34, avalia diversos produtos, processos e serviços de acordo com normas e regulamentos técnicos rígidos e precisos. Todas as noites, ele entra no Catarse e avalia qual nova campanha de financiamento coletivo vai apoiar seguindo um critério bem mais amplo e subjetivo: “o projeto que tocar meu coração.”

Depois de mais de dois anos e meio nessa rotina, o dentista de formação foi o primeiro alcançar, em outubro de 2013, a inspiradora marca de 100 projetos apoiados, com um total de R$ 2.700. “É uma oportunidade fascinante ser convidado para compartilhar o sonho de uma pessoa e ainda receber uma recompensa por essa experiência.”

Fazer parte de uma centena de sonhos não levou o ex-tenente da Marinha que deixou a carreira por causa da rigidez do militarismo apenas ao posto de maior apoiador do Catarse, mas também já colocou seu nome na história do financiamento coletivo no Brasil. Assim como a família Médici foi fundamental para o florescimento do Renascimento italiano ao financiar Donatello, Michelangelo e outros tartarugas ninja, Humberto reinventa um mecenato pós-moderno ao protagonizar a cultura do micropatrocínio e fomentar diversas cadeias produtivas locais em todo o país.

O primeiro de uma centena

Sem nunca ter contribuído regularmente para nenhuma atividade ou instituição, o carioca nascido e criado no Leblon conheceu o financiamento coletivo em uma reportagem na madrugada do dia 6 abril de 2011, a mais fria do ano até então em diversas cidades do país.

Foi como se um mundo novo repleto de pessoas e ideias criativas e originais se desvelasse a sua frente. O calor da descoberta o fez abrir diversas plataformas para conhecer os projetos. No Kickstarter, decidiu contribuir para que o filme Dzi Croquetes entrasse em cartaz nos EUA e assim pudesse concorrer ao Oscar. No Catarse, cadastrado sob o número de usuário 3.439 (hoje são mais de 103 mil) resolveu financiar a ideia de duas estudantes de jornalismo da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) de construir um mapa multimídia colaborativo sobre os sons da capital paulista, o São Paulo Polifônica.

Encantado com a experiência, o ex-estudante de medicina que largou a profissão por querer ajudar as pessoas, mas sem lidar tão concretamente com a vida voltou à plataforma dois dias depois para ajudar uma estudante de design e produção cultural de Natal a viajar para o festival Youpix em São Paulo e produzir um diário da viagem com ilustrações. Desde então, não parou mais.  “O Catarse é o lugar mais democrático e menos burocrático para quem tem uma boa ideia”, resume.

Caricatura do Humberto feita pelo Rafael Koff como recompensa do projeto Cuecas Por Cima das Calças Caricatura do Humberto feita pelo Rafael Koff como recompensa do projeto Cuecas Por Cima das Calças

A mágica do financiamento coletivo

Por entrar diariamente no Catarse e apoiar em série projetos de desconhecidos que acabaram de entrar no ar, Humberto faz a mágica do financiamento coletivo acontecer: a possibilidade de qualquer pessoa no mundo interessada por aquela ideia contribuir para a sua realização. Muitas vezes, para surpresa dos realizadores dos projetos que não conhecem sua generosidade, é o primeiro a colocar dinheiro na empreitada. Foi assim com o centésimo projeto que apoiou, o documentário sobre Frei Galvão, e com A Vida de Lucas Batista. “O pessoal me mandou um e-mail me agradecendo por eu ter sido o primeiro a apoiar o projeto. Eles disseram que o fato de o primeiro apoiador ser um desconhecido da equipe era um importante motivador para a campanha que tinham pela frente.”

Apesar de não pensar em fazer um projeto, ele se sentiu na pele de um realizador quando se esforçou mais do que o costume para divulgar a campanha das Aventuras de Leca e seus Amigos. Tocado pela história de força de Paulo Machado, 45, que tem paralisia infantil, mora há 44 anos na UTI do Hospital das Clínicas em São Paulo e queria contar numa animação as histórias das crianças que passaram pela unidade com a mesma doença, fez sua maior contribuição para um projeto (R$ 150) e decidiu mobilizar suas redes para que mais gente fizesse o mesmo. “Mandei e-mails personalizados para mais de 100 amigos, pessoas que eu sei que podiam colaborar. Dois apoiaram o projeto.” Para felicidade dele, outras 1.930 pessoas também se identificaram com a história de Paulo e contribuíram com R$ 148 mil e o transformaram no segundo maior projeto do Catarse. Humberto agora aguarda ansiosamente pela recompensa do projeto: um DVD da animação, um livro e uma gravura pintada por Eliana Zagui, a Leca que dá nome ao projeto e também residente no hospital desde muito cedo pelo mesmo motivo do Paulo.

A recompensa é um acordo, não uma compra

Para Humberto, as recompensas são, ao mesmo tempo, um aspecto importante e sensível do financiamento coletivo. Ele estima que recebeu metade das contrapartidas dos projetos bem-sucedidos que apoiou. “A recompensa é um acordo que eu e o realizador estamos firmando. Não é uma compra. No começo, eu me estressava muito quando demorava ou não recebia minha recompensa. Agora, aprendi que faz parte do processo. O pior não é não receber a recompensa. É não receber nenhuma satisfação do autor do projeto. Quando chega uma recompensa de um projeto antigo que te traz um retorno legal daquela experiência, faz valer a pena a espera e as outras que nunca chegaram.”

A melhor recompensa que recebeu até hoje foi um vídeo de agradecimento de uma criança que participou da festa da peruca no Hospital das Clínicas em Porto Alegre do projeto Câncer Haircut Day. “Acho ruim quando uma pessoa pede R$ 100 e oferece um agradecimento por e-mail ou R$ 300 por um adesivo. É meio mesquinho. Parece que a pessoa nem se esforçou em ser criativa. Dá pra separar um dia para pensar numa coisa bacana para entregar aos apoiadores. Fiquei muito emocionado com o vídeo da menina do Câncer Hair Cut Day. Pode ser algo simples e que valorize aquela experiência.”

Como quando recebeu a recompensa do projeto do bloco de Carnaval Fogo e Paixão. O homenageado da agremiação, o cantor Wando participou da campanha e entre as melhores contrapartidas estavam calcinhas e camisas assinadas pelo um ícone do brega. O artista morreu durante a arrecadação, que depois atingiu a meta e permitiu um lindo desfile em memória do cantor. “Tive uma sensação estranha ao receber a camisa assinada pelo Wando. Sai com ela no Carnaval e as pessoas dos outros blocos olhavam e achavam que eu tinha inventado aquela assinatura. Quando cheguei no Fogo e Paixão e vi todas as outras pessoas com as camisas autografadas, foi uma energia muito legal.”

Inspiração para novos apoiadores

De tanto apoiar projetos no Catarse, Humberto se tornou um constante personagem de reportagens da imprensa. Depois que uma entrevista sua foi publicada no caderno Link, do Estadão, foi procurado por cinco pessoas diferentes para que patrocinasse integralmente projetos mirabolantes de produtos odontológicos e dividisse a renda com os inventores. Um deles era uma escova de dente “revolucionária”, como descreveu o autor da ideia. Intrigado com a proposta, consultou a namorada dentista e chegou a conclusão de que era um escova de dente normal apenas com uma cabeça gigante e que dificilmente entraria nas bocas de muitas pessoas por aí. “Essas pessoas não entenderam o que eu faço. Existe uma diferença no micropatrocínio. Não quero ganhar dinheiro com os projetos. Quero ajudar a realizar sonhos.”

Quando veio até o escritório do Catarse para fazer a entrevista e as fotos para este perfil, Humberto nos encantou com sua simpatia e generosidade. Tal como foi retratado pelo Rafael Koff, na recompensa do Cuecas por Cima das Calças, ele é um herói da construção paulatina da cultura do financiamento coletivo no Brasil. Um cavaleiro da luz em sua batalha diária por uma sociedade mais solidária, colaborativa, sincera, confiante e afetiva. Agradeci a ele pela disponibilidade, atenção e, principalmente, pela inspiração a toda a comunidade da plataforma. Ele agradeceu o nosso trabalho e fez um desejo para este post.

“Que a pessoa que leia a minha história tenha vontade de participar do financiamento coletivo!”

Tomara, Humberto! Tomara!

(Atualização em 14 de setembro de 2016). Pelo visto tem outras pessoas se inspirando com a história do Humberto! Olha a Katiani aqui e vê a história dela ;)

 

 
Felipe Caruso
Missionário do coletivismo e jornalista com doses de poesia, ceticismo e pragmatismo

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Humberto_figueira_30_out_2013-2

É uma oportunidade fascinante ser convidado a compartilhar o sonho de uma pessoa e ainda receber uma recompensa pela experiência

Todos os dias, o  analista executivo da Diretoria da Qualidade do Inmetro Humberto Figueira, 34, avalia diversos produtos, processos e serviços de acordo com normas e regulamentos técnicos rígidos e precisos. Todas as noites, ele entra no Catarse e avalia qual nova campanha de financiamento coletivo vai apoiar seguindo um critério bem mais amplo e subjetivo: “o projeto que tocar meu coração.”

Depois de mais de dois anos e meio nessa rotina, o dentista de formação foi o primeiro alcançar, em outubro de 2013, a inspiradora marca de 100 projetos apoiados, com um total de R$ 2.700. “É uma oportunidade fascinante ser convidado para compartilhar o sonho de uma pessoa e ainda receber uma recompensa por essa experiência.”

Fazer parte de uma centena de sonhos não levou o ex-tenente da Marinha que deixou a carreira por causa da rigidez do militarismo apenas ao posto de maior apoiador do Catarse, mas também já colocou seu nome na história do financiamento coletivo no Brasil. Assim como a família Médici foi fundamental para o florescimento do Renascimento italiano ao financiar Donatello, Michelangelo e outros tartarugas ninja, Humberto reinventa um mecenato pós-moderno ao protagonizar a cultura do micropatrocínio e fomentar diversas cadeias produtivas locais em todo o país.

O primeiro de uma centena

Sem nunca ter contribuído regularmente para nenhuma atividade ou instituição, o carioca nascido e criado no Leblon conheceu o financiamento coletivo em uma reportagem na madrugada do dia 6 abril de 2011, a mais fria do ano até então em diversas cidades do país.

Foi como se um mundo novo repleto de pessoas e ideias criativas e originais se desvelasse a sua frente. O calor da descoberta o fez abrir diversas plataformas para conhecer os projetos. No Kickstarter, decidiu contribuir para que o filme Dzi Croquetes entrasse em cartaz nos EUA e assim pudesse concorrer ao Oscar. No Catarse, cadastrado sob o número de usuário 3.439 (hoje são mais de 103 mil) resolveu financiar a ideia de duas estudantes de jornalismo da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) de construir um mapa multimídia colaborativo sobre os sons da capital paulista, o São Paulo Polifônica.

Encantado com a experiência, o ex-estudante de medicina que largou a profissão por querer ajudar as pessoas, mas sem lidar tão concretamente com a vida voltou à plataforma dois dias depois para ajudar uma estudante de design e produção cultural de Natal a viajar para o festival Youpix em São Paulo e produzir um diário da viagem com ilustrações. Desde então, não parou mais.  “O Catarse é o lugar mais democrático e menos burocrático para quem tem uma boa ideia”, resume.

Caricatura do Humberto feita pelo Rafael Koff como recompensa do projeto Cuecas Por Cima das Calças Caricatura do Humberto feita pelo Rafael Koff como recompensa do projeto Cuecas Por Cima das Calças

A mágica do financiamento coletivo

Por entrar diariamente no Catarse e apoiar em série projetos de desconhecidos que acabaram de entrar no ar, Humberto faz a mágica do financiamento coletivo acontecer: a possibilidade de qualquer pessoa no mundo interessada por aquela ideia contribuir para a sua realização. Muitas vezes, para surpresa dos realizadores dos projetos que não conhecem sua generosidade, é o primeiro a colocar dinheiro na empreitada. Foi assim com o centésimo projeto que apoiou, o documentário sobre Frei Galvão, e com A Vida de Lucas Batista. “O pessoal me mandou um e-mail me agradecendo por eu ter sido o primeiro a apoiar o projeto. Eles disseram que o fato de o primeiro apoiador ser um desconhecido da equipe era um importante motivador para a campanha que tinham pela frente.”

Apesar de não pensar em fazer um projeto, ele se sentiu na pele de um realizador quando se esforçou mais do que o costume para divulgar a campanha das Aventuras de Leca e seus Amigos. Tocado pela história de força de Paulo Machado, 45, que tem paralisia infantil, mora há 44 anos na UTI do Hospital das Clínicas em São Paulo e queria contar numa animação as histórias das crianças que passaram pela unidade com a mesma doença, fez sua maior contribuição para um projeto (R$ 150) e decidiu mobilizar suas redes para que mais gente fizesse o mesmo. “Mandei e-mails personalizados para mais de 100 amigos, pessoas que eu sei que podiam colaborar. Dois apoiaram o projeto.” Para felicidade dele, outras 1.930 pessoas também se identificaram com a história de Paulo e contribuíram com R$ 148 mil e o transformaram no segundo maior projeto do Catarse. Humberto agora aguarda ansiosamente pela recompensa do projeto: um DVD da animação, um livro e uma gravura pintada por Eliana Zagui, a Leca que dá nome ao projeto e também residente no hospital desde muito cedo pelo mesmo motivo do Paulo.

A recompensa é um acordo, não uma compra

Para Humberto, as recompensas são, ao mesmo tempo, um aspecto importante e sensível do financiamento coletivo. Ele estima que recebeu metade das contrapartidas dos projetos bem-sucedidos que apoiou. “A recompensa é um acordo que eu e o realizador estamos firmando. Não é uma compra. No começo, eu me estressava muito quando demorava ou não recebia minha recompensa. Agora, aprendi que faz parte do processo. O pior não é não receber a recompensa. É não receber nenhuma satisfação do autor do projeto. Quando chega uma recompensa de um projeto antigo que te traz um retorno legal daquela experiência, faz valer a pena a espera e as outras que nunca chegaram.”

A melhor recompensa que recebeu até hoje foi um vídeo de agradecimento de uma criança que participou da festa da peruca no Hospital das Clínicas em Porto Alegre do projeto Câncer Haircut Day. “Acho ruim quando uma pessoa pede R$ 100 e oferece um agradecimento por e-mail ou R$ 300 por um adesivo. É meio mesquinho. Parece que a pessoa nem se esforçou em ser criativa. Dá pra separar um dia para pensar numa coisa bacana para entregar aos apoiadores. Fiquei muito emocionado com o vídeo da menina do Câncer Hair Cut Day. Pode ser algo simples e que valorize aquela experiência.”

Como quando recebeu a recompensa do projeto do bloco de Carnaval Fogo e Paixão. O homenageado da agremiação, o cantor Wando participou da campanha e entre as melhores contrapartidas estavam calcinhas e camisas assinadas pelo um ícone do brega. O artista morreu durante a arrecadação, que depois atingiu a meta e permitiu um lindo desfile em memória do cantor. “Tive uma sensação estranha ao receber a camisa assinada pelo Wando. Sai com ela no Carnaval e as pessoas dos outros blocos olhavam e achavam que eu tinha inventado aquela assinatura. Quando cheguei no Fogo e Paixão e vi todas as outras pessoas com as camisas autografadas, foi uma energia muito legal.”

Inspiração para novos apoiadores

De tanto apoiar projetos no Catarse, Humberto se tornou um constante personagem de reportagens da imprensa. Depois que uma entrevista sua foi publicada no caderno Link, do Estadão, foi procurado por cinco pessoas diferentes para que patrocinasse integralmente projetos mirabolantes de produtos odontológicos e dividisse a renda com os inventores. Um deles era uma escova de dente “revolucionária”, como descreveu o autor da ideia. Intrigado com a proposta, consultou a namorada dentista e chegou a conclusão de que era um escova de dente normal apenas com uma cabeça gigante e que dificilmente entraria nas bocas de muitas pessoas por aí. “Essas pessoas não entenderam o que eu faço. Existe uma diferença no micropatrocínio. Não quero ganhar dinheiro com os projetos. Quero ajudar a realizar sonhos.”

Quando veio até o escritório do Catarse para fazer a entrevista e as fotos para este perfil, Humberto nos encantou com sua simpatia e generosidade. Tal como foi retratado pelo Rafael Koff, na recompensa do Cuecas por Cima das Calças, ele é um herói da construção paulatina da cultura do financiamento coletivo no Brasil. Um cavaleiro da luz em sua batalha diária por uma sociedade mais solidária, colaborativa, sincera, confiante e afetiva. Agradeci a ele pela disponibilidade, atenção e, principalmente, pela inspiração a toda a comunidade da plataforma. Ele agradeceu o nosso trabalho e fez um desejo para este post.

“Que a pessoa que leia a minha história tenha vontade de participar do financiamento coletivo!”

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