“Todo mundo tá pensando em sexo, todo mundo disfarçando muito bem”. O refrão da canção da banda mineira Porcas Borboletas resume a postura de governos e empresas em relação ao Pop Porn Festival. Por mais que tenha como tema um assunto que interessa a todos, o evento novamente será realizado sem qualquer ajuda estatal ou da iniciativa privada – apenas com o apoio do público via crowdfunding no Catarse.
“Cansamos de dar com a cara na porta indo atrás do poder público ou da iniciativa privada, onde só recebemos respostas preconceituosas, como se estivéssemos envolvidos em algum ato criminoso. É completamente ridículo ouvir de uma empresa de camisinha que ela não quer fazer parte de um evento que fala de sexo. E foram muitas respostas assim”, conta May Medeiros, 26, colaboradora do festival.
"Fazemos tudo pelo Catarse, acreditando que as pessoas também consideram importante ter um um evento como esse em São Paulo”, completa. No quinto ano do festival, a organização nem sequer procurou outras fontes. Até agora deu certo: outras três edições do Pop Porn Festival já foram financiadas em nossa plataforma.
“Cansamos de dar com a cara na porta indo atrás do poder público ou da iniciativa privada, só recebemos respostas preconceituosas. É ridículo ouvir de uma empresa de camisinha que ela não quer fazer parte de um evento que fala de sexo", May Medeiros
Nos dias 13 e 14 de junho, o festival vai abordar as diversas formas de sexualidade com exibição de 30 filmes, performances, workshops e debates. As atrações são bem variadas, de mesas sobre a importância de ainda se falar sobre Aids – discussão que terá participação do deputado federal Jean Willys – a aulas de massagem tântrica e workshops de produção de vídeos pornográficos caseiros ministrados por profissionais do ramo.
As práticas de BDSM, em alta recentemente por causa do filme (baseado no bestseller) “50 tons de cinza” também fazem parte da programação. “Não queríamos abordar o tema de maneira oportunista, se aproveitando da repercussão. Temos a preocupação de que pessoas que viram o filme acabem se machucando tentando imitar as cenas. Teremos um workshop de Spanking, para que essas pessoas possam aprender os limites, saber até que nível pode bater, até onde pode apertar uma corda, brincar de enforcar. Vamos tentar trabalhar todos os limites da BDSM com responsabilidade” (é possível garantir sua participação nos workshops pelas recompensas do crowdfunding).
Pergunta do repórter: como é organizar um festival assim em um momento em que setores conservadores parecem estar cada vez mais fortes na política (veja levantamento do El País sobre o Congresso)?
“Esse ano sentimos mais do que nunca a necessidade de cutucar a ferida. É um festival completamente independente, underground, que toca nesses temas que incomodam muita gente do poder público. A indústria do sexo e o governo têm uma responsabilidade de falar do tema de maneira menos careta, mas isso não acontece. É uma questão de saúde, até econômica. Parece que entenderam que precisa falar de gênero, mas não entenderam que precisa falar de sexo”, responde May.
O ‘pai’ alemão
A grande inspiração do Pop Porn Festival é o PornFilmFestival, de Berlin. O ‘pai’ alemão, no entanto, está mais focado em exibições de filmes e performances do que em debates, e goza de aceitação mais fácil em sua terra natal. Uma prova disso é que os filmes da mostra são exibidos em diversos cinemas em Berlim.
A primeira edição brasileira foi como um “filhote” do Pornfilm, nas palavras de May. A relação entre os dois festivais ainda existe, conta: “Fomos lá [no PornFilm, em Berlin] no ano passado para reforçar a realização do nosso festival nesse ano”, conta Parte dos filmes que serão exibidos em São Paulo estiveram na mostra alemã.
Suzy Capó
Quem fazia parte da curadoria e do juri do PornFilmfestival era Suzy Capó, a grande responsável pela existência do Pop Porn Festival. Suzy morreu em janeiro deste ano e será homenageada no festival. Formada em jornalismo pela Universidade de Brasília e com mestrado em teoria de cinema e performance na New York University, ela foi curadora do festival Mix New York, e co-fundadadora do Festival Mix Brasil. Foi ela também a criadora do termo GLS.“Ela sentia a necessidade de se fazer algo que não se fazia no Brasil, de ir além do debate de gênero, discutir a diversidade da sexualidade”, explica May. Uma das exposições do festival será dedicada à jornalista e produtora cultural.