A descoberta da fatídica espiral da esperança direto do Vale da Morte de uma campanha

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Uma campanha de financiamento coletivo normalmente tem um gráfico de apoios em relação ao tempo em formato de “U”. No início, as pessoas mais próximas do realizador colaboram com o projeto, irradiando confiança para os apoiadores mais distantes ou desconhecidos. A aproximação do final do prazo de captação desperta o senso de urgência nas pessoas e elas se movimentam para contribuir. O período entre esses dois picos é o que chamamos de Vale da Morte, uma batalha diária para divulgar o projeto em busca de novos apoiadores. Diretamente do Vale da Morte da campanha do projeto 38 dias para transformar um mochilão num quadrinho, a ilustradora Lila Cruz conta seu aprendizado até aqui e a descoberta da fatídica espiral da esperança do financiamento coletivo: “quando você espera, todo mundo espera porque todo mundo está esperando, sabe?

“Quando entrei nessa, sabia que era difícil. Mas não é só difícil, é MUITO, MUITO cansativo. Porque você está com um sonho ali, na mão de um bocado de gente. E eles é que decidem se a sua parada vai acontecer.

Quando a gente coloca um projeto no ar, recebe algumas dicas importantes, inclusive do perfil costumeiro de apoiadores:

  • As pessoas vão apoiar bastante no início da campanha;

  • As pessoas vão descansar no meio da campanha, com o pensamento “ah, dá pra deixar pra depois”;

  • As pessoas vão correr nos últimos dias.

O que eu notei, nas conversas com pessoas que já colocaram seus projetos em financiamento coletivo, é que você basicamente fica no desespero até os dias finais. Se nos dias finais as pessoas se mobilizarem, ótimo. Se não, então é isso aí, fim. Porque a divulgação é massiva, sai em um monte de jornais, blogs e sites, o que é maravilhoso, mas as pessoas decidem inconscientemente que só vão apoiar a parada nos últimos dias, quando tiverem certeza de que ela vai rolar.

O problema é que, pra rolar, as pessoas precisam apoiar a parada – para que ela, então, chegue no final com a certeza de que vai acontecer, e possa até ter outras coisas legais. Claro, em tempos de crise as pessoas estão cada vez mais receosas de investir em qualquer coisa.

Mas pense, você que curtiu o projeto, que está lá, pronto pra apoiar, pronto no dia 2, pronto no dia 10, pronto no dia 20: a pessoa que possui o projeto depende desses apoios para planejar orçamentos, para estipular impressões de recompensas, para se movimentar no projeto. E é por isso que tantos projetos atrasam suas entregas. Porque como todo mundo espera o último minuto para apoiar, ninguém sabe realmente quantas pessoas haverá nos apoios e quanto terá para os gastos com correios, impressão etc. E aí, quando o projeto é bem sucedido, você tem todo aquele trabalho que podia ter sido feito durante a campanha pra ser feito depois, quando deveria estar apenas produzindo e imprimindo recompensas e produtos.

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Financiamento coletivo ainda é uma coisa muito recente no Brasil, pelo menos eu acho, porque expliquei pra muita gente o que era, que era seguro, que a pessoa recebe o dinheiro de volta se a campanha não der certo. Agora estou no meio da campanha, e quando chega esse período (que ainda falta um tempo mas não falta mais tanto tempo), você tem que batalhar com aquela galera que diz “esqueci de fazer ontem, vou fazer hoje” ou “que lindo, vou ler com calma depois”. Porque todo mundo é muito ocupado, e cada vez mais ocupado nessa vida, e você precisa conseguir um minuto daquela pessoa – acho que esse é o maior trabalho no crowdfunding.

E definitivamente aquela campanha é só sua, não é dela, ela não tem porque ter pressa, se desesperar. Você, por outro lado, tem. E dá uma vergonha MOR ter que chegar naquela pessoa que tem a vida dela toda pra dar conta e perguntar “E aí, você já apoiou o meu projeto?”. Só que é exatamente isso o que a gente tem que fazer, não tem jeito.

O que eu aprendi até agora?

1- Não tenha vergonha de abordar as pessoas, dar a cara a tapa.

2- Muita gente vai dizer “massa”, mas ninguém é obrigado a comprar sua parada, então você tem que ir pro próximo movimento sem se abalar se esse não der certo

3- Trabalhe como se a campanha já tivesse dado certo, pra não ser pego de surpresa depois

4- Não dá pra convencer uma pessoa de uma coisa que ela não quer fazer

5- Dou muito mais valor à produção independente do que eu já dava. Fato.

6- Se eu gostar de algum projeto em site de financiamento coletivo, apoio logo quando sobrar uma grana. Porque deixar as coisas para última hora ganhou um novo significado pra mim – não necessariamente bom.

Então – nesse início de mês, se você planejava apoiar os projetos que você gosta, e já tem uma grana sobrando ou um cartão que use tranquilo, faça logo, jovem. Não espere até os 10 últimos dias, porque os últimos dias não deveriam ser pra isso. Quando você espera, todo mundo espera porque todo mundo está esperando, sabe? E aí a coisa não anda pra frente. Isso vale pra qualquer coisa, dentro e fora do crowdfunding.”

 

O texto da Lila foi publicado originalmente no blog dela.
Felipe Caruso
Missionário do coletivismo e jornalista com doses de poesia, ceticismo e pragmatismo

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A descoberta da fatídica espiral da esperança direto do Vale da Morte de uma campanha

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Uma campanha de financiamento coletivo normalmente tem um gráfico de apoios em relação ao tempo em formato de “U”. No início, as pessoas mais próximas do realizador colaboram com o projeto, irradiando confiança para os apoiadores mais distantes ou desconhecidos. A aproximação do final do prazo de captação desperta o senso de urgência nas pessoas e elas se movimentam para contribuir. O período entre esses dois picos é o que chamamos de Vale da Morte, uma batalha diária para divulgar o projeto em busca de novos apoiadores. Diretamente do Vale da Morte da campanha do projeto 38 dias para transformar um mochilão num quadrinho, a ilustradora Lila Cruz conta seu aprendizado até aqui e a descoberta da fatídica espiral da esperança do financiamento coletivo: “quando você espera, todo mundo espera porque todo mundo está esperando, sabe?

“Quando entrei nessa, sabia que era difícil. Mas não é só difícil, é MUITO, MUITO cansativo. Porque você está com um sonho ali, na mão de um bocado de gente. E eles é que decidem se a sua parada vai acontecer.

Quando a gente coloca um projeto no ar, recebe algumas dicas importantes, inclusive do perfil costumeiro de apoiadores:

  • As pessoas vão apoiar bastante no início da campanha;

  • As pessoas vão descansar no meio da campanha, com o pensamento “ah, dá pra deixar pra depois”;

  • As pessoas vão correr nos últimos dias.

O que eu notei, nas conversas com pessoas que já colocaram seus projetos em financiamento coletivo, é que você basicamente fica no desespero até os dias finais. Se nos dias finais as pessoas se mobilizarem, ótimo. Se não, então é isso aí, fim. Porque a divulgação é massiva, sai em um monte de jornais, blogs e sites, o que é maravilhoso, mas as pessoas decidem inconscientemente que só vão apoiar a parada nos últimos dias, quando tiverem certeza de que ela vai rolar.

O problema é que, pra rolar, as pessoas precisam apoiar a parada – para que ela, então, chegue no final com a certeza de que vai acontecer, e possa até ter outras coisas legais. Claro, em tempos de crise as pessoas estão cada vez mais receosas de investir em qualquer coisa.

Mas pense, você que curtiu o projeto, que está lá, pronto pra apoiar, pronto no dia 2, pronto no dia 10, pronto no dia 20: a pessoa que possui o projeto depende desses apoios para planejar orçamentos, para estipular impressões de recompensas, para se movimentar no projeto. E é por isso que tantos projetos atrasam suas entregas. Porque como todo mundo espera o último minuto para apoiar, ninguém sabe realmente quantas pessoas haverá nos apoios e quanto terá para os gastos com correios, impressão etc. E aí, quando o projeto é bem sucedido, você tem todo aquele trabalho que podia ter sido feito durante a campanha pra ser feito depois, quando deveria estar apenas produzindo e imprimindo recompensas e produtos.

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Financiamento coletivo ainda é uma coisa muito recente no Brasil, pelo menos eu acho, porque expliquei pra muita gente o que era, que era seguro, que a pessoa recebe o dinheiro de volta se a campanha não der certo. Agora estou no meio da campanha, e quando chega esse período (que ainda falta um tempo mas não falta mais tanto tempo), você tem que batalhar com aquela galera que diz “esqueci de fazer ontem, vou fazer hoje” ou “que lindo, vou ler com calma depois”. Porque todo mundo é muito ocupado, e cada vez mais ocupado nessa vida, e você precisa conseguir um minuto daquela pessoa – acho que esse é o maior trabalho no crowdfunding.

E definitivamente aquela campanha é só sua, não é dela, ela não tem porque ter pressa, se desesperar. Você, por outro lado, tem. E dá uma vergonha MOR ter que chegar naquela pessoa que tem a vida dela toda pra dar conta e perguntar “E aí, você já apoiou o meu projeto?”. Só que é exatamente isso o que a gente tem que fazer, não tem jeito.

O que eu aprendi até agora?

1- Não tenha vergonha de abordar as pessoas, dar a cara a tapa.

2- Muita gente vai dizer “massa”, mas ninguém é obrigado a comprar sua parada, então você tem que ir pro próximo movimento sem se abalar se esse não der certo

3- Trabalhe como se a campanha já tivesse dado certo, pra não ser pego de surpresa depois

4- Não dá pra convencer uma pessoa de uma coisa que ela não quer fazer

5- Dou muito mais valor à produção independente do que eu já dava. Fato.

6- Se eu gostar de algum projeto em site de financiamento coletivo, apoio logo quando sobrar uma grana. Porque deixar as coisas para última hora ganhou um novo significado pra mim – não necessariamente bom.

Então – nesse início de mês, se você planejava apoiar os projetos que você gosta, e já tem uma grana sobrando ou um cartão que use tranquilo, faça logo, jovem. Não espere até os 10 últimos dias, porque os últimos dias não deveriam ser pra isso. Quando você espera, todo mundo espera porque todo mundo está esperando, sabe? E aí a coisa não anda pra frente. Isso vale pra qualquer coisa, dentro e fora do crowdfunding.”

 

O texto da Lila foi publicado originalmente no blog dela.

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