Da web para o papel: como tirinhas viraram HQs completas com o apoio da comunidade

Antes de falarmos  sobre Webtoons, precisamos entender a história das próprias histórias em quadrinhos, para melhor conectar seus pontos de adaptação durante sua trajetória.

Moldando um pouco o conceito dos primeiros registros de escrita, datados em mais de 3000 A.E.C (Antes da Era Comum), a arte sequencial, como é conhecida hoje, nasce por volta do Século V, derivada de um conjunto de ideias, podendo ser assimilada desde a arte rupestre nas paredes das cavernas, até as placas de argila sumérias. Elas seguiam uma ordem cronológica e, apesar de algumas diferenças, ainda se encaixavam no conceito de contar histórias por meio de gravuras. 

Os primórdios

Se focarmos em alguns grupos nômades da Índia, conseguimos destacar a necessidade de carregar consigo informações em pinturas em tecidos. Primeiramente, carregando planos e estratégias de sobrevivência, seguido de contos e relatos acumulados ao longo do continente asiático, enriquecendo narrativas e perspectivas dos locais em que passavam. 

Esses tecidos cheios de gravuras, logo deram vez para rolos de papel que, além de informações pessoais, relatos e notícias de povoados, também foram incrementados com lendas e contos ora vistos como fantasiosos, ora como parte da perspectiva religiosa. Essas gravuras levavam histórias adiante, tanto na forma de entretenimento, quanto com caráter informativo e até mesmo como forma de sustento para os contadores de histórias.

Aqui vale uma menção honrosa aos primeiros livros impressos mais próximos aos moldes que conhecemos hoje! No século XV, a invenção da prensa de tipos móveis, tornou mais prático o compartilhamento de informações. Como o custo de produção era alto, é provável que tenha surgido a necessidade de tornar ainda mais prático o acesso popular à informação, dando origem aos jornais Mesmo sem ser possível cravar uma origem específica, pesquisas reduzem a um espaço entre a Alemanha e a Rússia por volta do século XVII.

As transformações da arte sequencial

Dada essa contextualização histórica, é possível  fazer um atalho até as tirinhas de jornais, uma linguagem criada para tornar menos evidente as críticas sociais de forma geral. Assim nascem as sátiras, uma crítica de forma cômica, para enfim chegarmos à origem dos “comics”. 

Essas tirinhas foram ganhando cada vez mais espaço ao longo do tempo, até o grande estouro no século XIX com diversas histórias, cada vez mais longas, com mais quadros, até com mais páginas, em diferentes formatos. O que teve início em uma leitura horizontal nos pequenos espaços que o jornal permitia, cresce e expande para a “leitura vertical em Z”, como se moldam as edições solo de cada revista em quadrinhos (focando no modo ocidental de leitura).

Histórias em quadrinhos se tornaram um mercado independente dos jornais, com editoras próprias e modelos diferentes. Deixo aqui a recomendação do livro “A história dos quadrinhos americanos” da Pesquisadora Laluña Machado, pela editora Skript, e também o livro: “Uma pequena história dos quadrinhos para uso das novas gerações” de Rogério Campos, pela editora Veneta.

O ponto que eu quero chegar, é que o quadrinho vive sob dois propósitos desde o início: informar e se adaptar. Quando a internet se popularizou nos EUA por volta dos anos 90, uma nova rede de distribuição de informação chegava até nós, não só no método, mas também no seu formato. Notícias eram compartilhadas por meios de sites, leituras mais longas e horizontais, simulando a passagem de páginas, por meio da digitalização das edições. Anos depois, até a chegada dos smartphones forçarem uma nova adaptação no método de leitura a partir das redes sociais, o famoso “arrasta pra cima” deu origem ao formato Webtoon, que viria, inclusive, a se tornar um site dedicado a tirinhas verticais.

O surgimento das Webtoons

Criado em 2003 por JunKoo Kim e lançado em 2004 na Coreia do Sul pela empresa Naver, inicialmente a plataforma era uma forma de compartilhar ilustrações, uma mescla de Instagram do velho testamento com Pinterest, e posteriormente ganhou atualizações para publicações de histórias completas. Em 2014 houve uma expansão internacional da plataforma, traduzida para o inglês, e atualmente conta com diversos idiomas e servidores com histórias de artistas do mundo todo.

A facilidade ao método de publicação fez com que surgissem mais tirinhas virtuais, e novas plataformas, como o TAPAS, Toomics, Tappytoon entre outros, ampliando a proposta de artistas ganharem voz, notoriedade e apelo para que suas obras ganhassem versões físicas,  como materialização de um sonho. 

Com uma agenda de periodicidade, é feita a postagem em partes de suas obras, criando conexões com leitores e personagens, bem como funcionam as novelas. Esse formato abriu as portas para fidelizar leitores com uma certa segurança para abrir um financiamento coletivo e conseguir expandir suas histórias para livrarias, comic shops e distribuidoras em geral.

Webtoons, a seu modo, também são muito comuns aqui no Brasil. Se eu puder indicar alguns dos meus favoritos, seria: Os Santos e seu Spin-off Confinada, de Triscila Oliveira e Leandro Assis, que iniciaram como tirinhas semanais no instagram durante a pandemia de Covid-19, e logo ganharam versões impressas pela editora todavia. Outro é o Cuscuz Surpresa de Daniel Cesart e Helô D’Angelo, também iniciada no Instagram em 2023 e ganharam sua versão impressa com financiamento coletivo aqui pelo Catarse. 

Temos também as tirinhas de Cecilia Ramos, a Cartumante, que desde 2018 transforma tirinhas de redes sociais em quadrinhos físicos, com seus projetos Memes São a Salvação, OBRIGADO! Foi um Transtorno, Meu Tarô e No Andar de Baixo, Carlos Ruas com Cães e Gatos, publicadas pela primeira vez no Funktoon em 2016, Um Sábado Qualquer que também tiveram campanha aqui no Catarse. 

No fim, a arte sequencial não define só uma sequência de imagens contando uma história, mas também o poder de se adaptar para dar sequência ao legado artístico com estilo, em quaisquer formatos que se apresentem.

Que venham os próximos métodos, estamos aqui, e estamos esperando…

directed by Michael Bay.

Manoel Taylor
Ilustrador, pesquisador e criador de conteúdo que aborda estudos socioculturais nos quadrinhos e mangás.

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Da web para o papel: como tirinhas viraram HQs completas com o apoio da comunidade

Antes de falarmos  sobre Webtoons, precisamos entender a história das próprias histórias em quadrinhos, para melhor conectar seus pontos de adaptação durante sua trajetória.

Moldando um pouco o conceito dos primeiros registros de escrita, datados em mais de 3000 A.E.C (Antes da Era Comum), a arte sequencial, como é conhecida hoje, nasce por volta do Século V, derivada de um conjunto de ideias, podendo ser assimilada desde a arte rupestre nas paredes das cavernas, até as placas de argila sumérias. Elas seguiam uma ordem cronológica e, apesar de algumas diferenças, ainda se encaixavam no conceito de contar histórias por meio de gravuras. 

Os primórdios

Se focarmos em alguns grupos nômades da Índia, conseguimos destacar a necessidade de carregar consigo informações em pinturas em tecidos. Primeiramente, carregando planos e estratégias de sobrevivência, seguido de contos e relatos acumulados ao longo do continente asiático, enriquecendo narrativas e perspectivas dos locais em que passavam. 

Esses tecidos cheios de gravuras, logo deram vez para rolos de papel que, além de informações pessoais, relatos e notícias de povoados, também foram incrementados com lendas e contos ora vistos como fantasiosos, ora como parte da perspectiva religiosa. Essas gravuras levavam histórias adiante, tanto na forma de entretenimento, quanto com caráter informativo e até mesmo como forma de sustento para os contadores de histórias.

Aqui vale uma menção honrosa aos primeiros livros impressos mais próximos aos moldes que conhecemos hoje! No século XV, a invenção da prensa de tipos móveis, tornou mais prático o compartilhamento de informações. Como o custo de produção era alto, é provável que tenha surgido a necessidade de tornar ainda mais prático o acesso popular à informação, dando origem aos jornais Mesmo sem ser possível cravar uma origem específica, pesquisas reduzem a um espaço entre a Alemanha e a Rússia por volta do século XVII.

As transformações da arte sequencial

Dada essa contextualização histórica, é possível  fazer um atalho até as tirinhas de jornais, uma linguagem criada para tornar menos evidente as críticas sociais de forma geral. Assim nascem as sátiras, uma crítica de forma cômica, para enfim chegarmos à origem dos “comics”. 

Essas tirinhas foram ganhando cada vez mais espaço ao longo do tempo, até o grande estouro no século XIX com diversas histórias, cada vez mais longas, com mais quadros, até com mais páginas, em diferentes formatos. O que teve início em uma leitura horizontal nos pequenos espaços que o jornal permitia, cresce e expande para a “leitura vertical em Z”, como se moldam as edições solo de cada revista em quadrinhos (focando no modo ocidental de leitura).

Histórias em quadrinhos se tornaram um mercado independente dos jornais, com editoras próprias e modelos diferentes. Deixo aqui a recomendação do livro “A história dos quadrinhos americanos” da Pesquisadora Laluña Machado, pela editora Skript, e também o livro: “Uma pequena história dos quadrinhos para uso das novas gerações” de Rogério Campos, pela editora Veneta.

O ponto que eu quero chegar, é que o quadrinho vive sob dois propósitos desde o início: informar e se adaptar. Quando a internet se popularizou nos EUA por volta dos anos 90, uma nova rede de distribuição de informação chegava até nós, não só no método, mas também no seu formato. Notícias eram compartilhadas por meios de sites, leituras mais longas e horizontais, simulando a passagem de páginas, por meio da digitalização das edições. Anos depois, até a chegada dos smartphones forçarem uma nova adaptação no método de leitura a partir das redes sociais, o famoso “arrasta pra cima” deu origem ao formato Webtoon, que viria, inclusive, a se tornar um site dedicado a tirinhas verticais.

O surgimento das Webtoons

Criado em 2003 por JunKoo Kim e lançado em 2004 na Coreia do Sul pela empresa Naver, inicialmente a plataforma era uma forma de compartilhar ilustrações, uma mescla de Instagram do velho testamento com Pinterest, e posteriormente ganhou atualizações para publicações de histórias completas. Em 2014 houve uma expansão internacional da plataforma, traduzida para o inglês, e atualmente conta com diversos idiomas e servidores com histórias de artistas do mundo todo.

A facilidade ao método de publicação fez com que surgissem mais tirinhas virtuais, e novas plataformas, como o TAPAS, Toomics, Tappytoon entre outros, ampliando a proposta de artistas ganharem voz, notoriedade e apelo para que suas obras ganhassem versões físicas,  como materialização de um sonho. 

Com uma agenda de periodicidade, é feita a postagem em partes de suas obras, criando conexões com leitores e personagens, bem como funcionam as novelas. Esse formato abriu as portas para fidelizar leitores com uma certa segurança para abrir um financiamento coletivo e conseguir expandir suas histórias para livrarias, comic shops e distribuidoras em geral.

Webtoons, a seu modo, também são muito comuns aqui no Brasil. Se eu puder indicar alguns dos meus favoritos, seria: Os Santos e seu Spin-off Confinada, de Triscila Oliveira e Leandro Assis, que iniciaram como tirinhas semanais no instagram durante a pandemia de Covid-19, e logo ganharam versões impressas pela editora todavia. Outro é o Cuscuz Surpresa de Daniel Cesart e Helô D’Angelo, também iniciada no Instagram em 2023 e ganharam sua versão impressa com financiamento coletivo aqui pelo Catarse. 

Temos também as tirinhas de Cecilia Ramos, a Cartumante, que desde 2018 transforma tirinhas de redes sociais em quadrinhos físicos, com seus projetos Memes São a Salvação, OBRIGADO! Foi um Transtorno, Meu Tarô e No Andar de Baixo, Carlos Ruas com Cães e Gatos, publicadas pela primeira vez no Funktoon em 2016, Um Sábado Qualquer que também tiveram campanha aqui no Catarse. 

No fim, a arte sequencial não define só uma sequência de imagens contando uma história, mas também o poder de se adaptar para dar sequência ao legado artístico com estilo, em quaisquer formatos que se apresentem.

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