A importância dos influenciadores para o mercado editorial

Gostaria que você que está começando a ler esse texto fizesse um favor pra mim e imaginasse uma pessoa que lê. O que você imaginou?

Muito provavelmente, você pensou em alguém em um canto do quarto ou da sala, algum cômodo silencioso, sentado, lendo um livro físico ou utilizando um e-reader ou uma tablet. Também pode estar numa biblioteca cheia, num parque, ou num metrô lotado. Essa pessoa provavelmente está imersa em sua leitura, no seu próprio mundinho imaginário, e talvez nem esteja prestando atenção em nada ao seu redor justamente por causa disso, independente de estar num ambiente silencioso ou não. Também, provavelmente, essa pessoa está sozinha.

Acertei?

Pois é, por muito tempo, a imagem que nós leitores tivemos de nós mesmos – e que talvez ainda tenhamos –, é de que ler sempre foi um hobbie solitário, uma coisa que fazemos sem companhia. Mas não precisa ser assim, e já faz bastante tempo que não é.

O que é um influenciador literário? 

Basta uma pequena pesquisa na rede social favorita pra encontrar alguém que cria conteúdo literário na internet e cuja caixa de comentários está sempre cheia de gente que compartilha ou não sua opinião sobre determinado livro, e o caminho natural é reconhecer essa pessoa como uma influenciadora literária. Eu sei, eu sei, talvez você tenha torcido o nariz pra essa palavra uma ou duas (ou dez!) vezes nas últimas semanas, mas a verdade é que o termo influenciador é o correto, quer a gente goste ou não.

LEIA TAMBÉM: Do TikTok para as estantes: como o bookTok está transformando o mercado literário

O dicionário de Oxford define influenciar de dois jeitos: o primeiro, como exercer uma ação psicológica sobre algo ou alguém, e o segundo, como causar ou sofrer uma modificação física ou intelectual. Eu gosto muito desse segundo pra definir um influenciador literário, e vou explicar por quê.

Eu considero que o meu primeiro trabalho de influência foi quando eu tinha 8 anos de idade.

Fui uma criança muito quietinha, mas que também teve muitos amigos mesmo assim, e, muito embora eu gostasse muito deles e também amasse as brincadeiras inventadas para a hora do recreio na minha escola, eu também amava visitar a biblioteca, que era muito bem abastecida já que eu tive o privilégio de estudar em escolas particulares. Quanto mais eu evitava brincar com meus amigos e escolhia a biblioteca como entretenimento para a hora do recreio, mais amigos me seguiam, porque queriam estar comigo. E, já que pra estar comigo eles precisavam estar lendo, eles liam junto comigo. Cada um o seu livro, em silêncio, por meia hora (que era o tempo do recreio).

Não demorou muito pra gente começar a trocar livros uns com os outros conforme terminamos de ler, e assim, informalmente criamos um clubinho do livro, onde cada um lia o livro no seu tempo e depois comentava com o amiguinho que já tinha terminado. Quando todo mundo do grupo já tinha terminado de ler o livro, a gente incorporava a história em uma das nossas brincadeiras (por quê não?) e todo mundo ficava feliz.

Já aos 8 anos de idade, eu consegui entender que ser uma leitora significava que, às vezes, uma coisa que começava com um hobbie solitário, virava uma ferramenta de conexão com outras pessoas, e que, ao terminar um livro e passar pro meu amiguinho ler em seguida, eu estava influenciando ele a ler algo que eu tinha gostado, e que talvez ele também gostasse.

Eu cresci procurando por isso o tempo todo, em todos os amigos que eu fazia. E então, em 2015, tudo mudou.

SAIBA MAIS: O fim da era dos seguidores e por que você deve formar uma comunidade

As comunidades literárias

Muito antes do que hoje a gente conhece como bookstagram e booktok (contas do Instagram e do TikTok voltadas para o conteúdo literário), existiu o YouTube. E foi lá que eu encontrei canais como o Olhos de Ressaca, o Geek Freak, o Vitor Martins, a Mayra Sigwalt e tantos outros internacionais que eu passei a acompanhar fervorosamente. Eu me reconectei com uma amiga antiga porque achei seu canal literário (alô, Pam Gonçalves), e conheci outro canal incrível de uma grande amiga dela (um beijo, Bel!). Quando eu me dei conta, tinha entendido que a internet modificou o meu primeiro clubinho do livro e fez eu me sentir ainda mais completa.

É complicado entender o papel de um influenciador literário quando o livro é uma coisa tão pessoal, afinal, ainda usando meu clubinho do livro como exemplo, quem escolheu estar na biblioteca fui EU, e fui EU quem escolhi todos os livros que eu ia ler. Mas, ao falar abertamente sobre eles, eu criei uma comunidade (ou melhor, aproximei ainda mais os laços de uma amizade que já existia, mas vocês entenderam) que confiava na ajuda da mini-Duds para escolher o que ler a seguir.

É por meio dos influenciadores literários que ficamos sabendo que um livro foi lançado, que um livro tá sendo muito falado, e que algumas histórias são problemáticas e precisam virar um diálogo maior. Em contrapartida, um influenciador literário também é aquela pessoa que fala sobre um livro antigo e que marcou a vida delu, e aquilo te toca de alguma forma. Um vídeo ou um texto que te causa uma mudança física (um quentinho no coração) ou intelectual (um alívio).

Confiar em um influenciador literário é como se permitir entrar em um clubinho do livro onde você decide o que vai ler, mas tem sempre alguém pra te respaldar e te indicar alguma coisa que você pode gostar. É como confiar que aquilo que alguém tá falando, mesmo que por meio de uma publicidade, é na verdade um jeito da gente, coletivamente, ficar animado pelo futuro e por algo que ainda está por vir – um livro em pré-venda de alguém que tá escrevendo pela primeira vez, o final daquela série eletrizante, ou a autobiografia de uma pessoa que você admira.

Para além do marketing de influência

Por mais que o marketing ainda exista, e enquanto vivermos no regime capitalista sempre vai existir, o influenciador literário é muito mais do que isso. É uma pessoa em quem você confia abertamente, e cujo gosto literário está tão alinhado com o seu que é como receber um conselho de um melhor amigo. Para um influenciador literário, isso é uma honra.

Nunca vou esquecer quando eu e meus amigos nos juntamos para resolver os mistérios de uma edição da coleção Salve-se Quem Puder, quando tínhamos apenas 8 anos e muita imaginação. E da mesma forma, nunca vou esquecer quando eu assisti um vídeo e peguei uma recomendação de leitura que mudou minha vida pra sempre. Por fim, também nunca vou esquecer de quando eu precisei de uma injeção de boas vibrações e consegui isso no grupinho de Whatsapp do catarse de um criador literário, que aproxima leitores todos os dias.

No final das contas, seu hábito de leitura ainda pode ser solitário se você quiser, ou ele pode começar solitário e terminar em uma mesa de discussão em uma Bienal do Livro, ou em mensagens trocadas com um criador de conteúdo que tá falando do mesmo livro de você e que vai te validar.

Não é apenas sobre publicidade, sobre uma lua criadora de conteúdo que influencia uma maré de vendas, é sobre uma relação de confiança, de todos os lados, por muito tempo.

Hoje, quando eu imagino uma pessoa que lê, eu me imagino sentada no meu lugar favorito do sofá, lendo um livro, e pensando que eu não vejo a hora de falar sobre ele com todo mundo. 

Eu, meu livro, e a certeza de que eu não estou mais sozinha na leitura.

Duds Saldanha
Criadora de conteúdo, ilustradora e designer, com experiência na internet desde 2009. Escreveu e ilustrou para os livros Capitolina Volumes 1 e 2, publicados pela Editora Seguinte, e tão apaixonada por design e papelaria que resolveu abrir a sua.

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Gostaria que você que está começando a ler esse texto fizesse um favor pra mim e imaginasse uma pessoa que lê. O que você imaginou?

Muito provavelmente, você pensou em alguém em um canto do quarto ou da sala, algum cômodo silencioso, sentado, lendo um livro físico ou utilizando um e-reader ou uma tablet. Também pode estar numa biblioteca cheia, num parque, ou num metrô lotado. Essa pessoa provavelmente está imersa em sua leitura, no seu próprio mundinho imaginário, e talvez nem esteja prestando atenção em nada ao seu redor justamente por causa disso, independente de estar num ambiente silencioso ou não. Também, provavelmente, essa pessoa está sozinha.

Acertei?

Pois é, por muito tempo, a imagem que nós leitores tivemos de nós mesmos – e que talvez ainda tenhamos –, é de que ler sempre foi um hobbie solitário, uma coisa que fazemos sem companhia. Mas não precisa ser assim, e já faz bastante tempo que não é.

O que é um influenciador literário? 

Basta uma pequena pesquisa na rede social favorita pra encontrar alguém que cria conteúdo literário na internet e cuja caixa de comentários está sempre cheia de gente que compartilha ou não sua opinião sobre determinado livro, e o caminho natural é reconhecer essa pessoa como uma influenciadora literária. Eu sei, eu sei, talvez você tenha torcido o nariz pra essa palavra uma ou duas (ou dez!) vezes nas últimas semanas, mas a verdade é que o termo influenciador é o correto, quer a gente goste ou não.

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O dicionário de Oxford define influenciar de dois jeitos: o primeiro, como exercer uma ação psicológica sobre algo ou alguém, e o segundo, como causar ou sofrer uma modificação física ou intelectual. Eu gosto muito desse segundo pra definir um influenciador literário, e vou explicar por quê.

Eu considero que o meu primeiro trabalho de influência foi quando eu tinha 8 anos de idade.

Fui uma criança muito quietinha, mas que também teve muitos amigos mesmo assim, e, muito embora eu gostasse muito deles e também amasse as brincadeiras inventadas para a hora do recreio na minha escola, eu também amava visitar a biblioteca, que era muito bem abastecida já que eu tive o privilégio de estudar em escolas particulares. Quanto mais eu evitava brincar com meus amigos e escolhia a biblioteca como entretenimento para a hora do recreio, mais amigos me seguiam, porque queriam estar comigo. E, já que pra estar comigo eles precisavam estar lendo, eles liam junto comigo. Cada um o seu livro, em silêncio, por meia hora (que era o tempo do recreio).

Não demorou muito pra gente começar a trocar livros uns com os outros conforme terminamos de ler, e assim, informalmente criamos um clubinho do livro, onde cada um lia o livro no seu tempo e depois comentava com o amiguinho que já tinha terminado. Quando todo mundo do grupo já tinha terminado de ler o livro, a gente incorporava a história em uma das nossas brincadeiras (por quê não?) e todo mundo ficava feliz.

Já aos 8 anos de idade, eu consegui entender que ser uma leitora significava que, às vezes, uma coisa que começava com um hobbie solitário, virava uma ferramenta de conexão com outras pessoas, e que, ao terminar um livro e passar pro meu amiguinho ler em seguida, eu estava influenciando ele a ler algo que eu tinha gostado, e que talvez ele também gostasse.

Eu cresci procurando por isso o tempo todo, em todos os amigos que eu fazia. E então, em 2015, tudo mudou.

SAIBA MAIS: O fim da era dos seguidores e por que você deve formar uma comunidade

As comunidades literárias

Muito antes do que hoje a gente conhece como bookstagram e booktok (contas do Instagram e do TikTok voltadas para o conteúdo literário), existiu o YouTube. E foi lá que eu encontrei canais como o Olhos de Ressaca, o Geek Freak, o Vitor Martins, a Mayra Sigwalt e tantos outros internacionais que eu passei a acompanhar fervorosamente. Eu me reconectei com uma amiga antiga porque achei seu canal literário (alô, Pam Gonçalves), e conheci outro canal incrível de uma grande amiga dela (um beijo, Bel!). Quando eu me dei conta, tinha entendido que a internet modificou o meu primeiro clubinho do livro e fez eu me sentir ainda mais completa.

É complicado entender o papel de um influenciador literário quando o livro é uma coisa tão pessoal, afinal, ainda usando meu clubinho do livro como exemplo, quem escolheu estar na biblioteca fui EU, e fui EU quem escolhi todos os livros que eu ia ler. Mas, ao falar abertamente sobre eles, eu criei uma comunidade (ou melhor, aproximei ainda mais os laços de uma amizade que já existia, mas vocês entenderam) que confiava na ajuda da mini-Duds para escolher o que ler a seguir.

É por meio dos influenciadores literários que ficamos sabendo que um livro foi lançado, que um livro tá sendo muito falado, e que algumas histórias são problemáticas e precisam virar um diálogo maior. Em contrapartida, um influenciador literário também é aquela pessoa que fala sobre um livro antigo e que marcou a vida delu, e aquilo te toca de alguma forma. Um vídeo ou um texto que te causa uma mudança física (um quentinho no coração) ou intelectual (um alívio).

Confiar em um influenciador literário é como se permitir entrar em um clubinho do livro onde você decide o que vai ler, mas tem sempre alguém pra te respaldar e te indicar alguma coisa que você pode gostar. É como confiar que aquilo que alguém tá falando, mesmo que por meio de uma publicidade, é na verdade um jeito da gente, coletivamente, ficar animado pelo futuro e por algo que ainda está por vir – um livro em pré-venda de alguém que tá escrevendo pela primeira vez, o final daquela série eletrizante, ou a autobiografia de uma pessoa que você admira.

Para além do marketing de influência

Por mais que o marketing ainda exista, e enquanto vivermos no regime capitalista sempre vai existir, o influenciador literário é muito mais do que isso. É uma pessoa em quem você confia abertamente, e cujo gosto literário está tão alinhado com o seu que é como receber um conselho de um melhor amigo. Para um influenciador literário, isso é uma honra.

Nunca vou esquecer quando eu e meus amigos nos juntamos para resolver os mistérios de uma edição da coleção Salve-se Quem Puder, quando tínhamos apenas 8 anos e muita imaginação. E da mesma forma, nunca vou esquecer quando eu assisti um vídeo e peguei uma recomendação de leitura que mudou minha vida pra sempre. Por fim, também nunca vou esquecer de quando eu precisei de uma injeção de boas vibrações e consegui isso no grupinho de Whatsapp do catarse de um criador literário, que aproxima leitores todos os dias.

No final das contas, seu hábito de leitura ainda pode ser solitário se você quiser, ou ele pode começar solitário e terminar em uma mesa de discussão em uma Bienal do Livro, ou em mensagens trocadas com um criador de conteúdo que tá falando do mesmo livro de você e que vai te validar.

Não é apenas sobre publicidade, sobre uma lua criadora de conteúdo que influencia uma maré de vendas, é sobre uma relação de confiança, de todos os lados, por muito tempo.

Hoje, quando eu imagino uma pessoa que lê, eu me imagino sentada no meu lugar favorito do sofá, lendo um livro, e pensando que eu não vejo a hora de falar sobre ele com todo mundo. 

Eu, meu livro, e a certeza de que eu não estou mais sozinha na leitura.

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